A convivência entre coproprietários de um mesmo imóvel pode se tornar delicada, especialmente quando os direitos de propriedade não caminham lado a lado com a posse ou o uso cotidiano do bem. Em decisão recente, a 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) trouxe um novo olhar sobre esse tipo de situação ao reconhecer que as obrigações financeiras de um imóvel devem ser repartidas entre os donos, independentemente de quem reside no local.
O caso envolvia um imóvel em Curitiba, adquirido em leilão por duas pessoas com participação igualitária de 50%. Apesar de apenas um dos coproprietários ocupar o imóvel e pagar um valor de aluguel ao outro, a ação judicial levou à discussão sobre a extinção do condomínio, o arbitramento do aluguel e a posterior alienação judicial do bem. O ponto central da controvérsia, no entanto, era a responsabilidade pelas despesas do imóvel, como IPTU e taxa condominial.
Direito de propriedade implica dever de contribuir
Para resolver a questão, o relator do caso, desembargador Péricles Bellusci De Batista Pereira, baseou-se no art. 1.315 do Código Civil, que determina que “o condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita”. A leitura jurídica sustenta que ser proprietário de um bem indivisível exige não apenas usufruto, mas também compromisso financeiro proporcional à titularidade.
A decisão judicial reforça que essas obrigações não estão vinculadas ao uso efetivo do imóvel, mas sim à qualidade de coproprietário. Ao citar doutrina clássica, o relator lembrou que “as despesas de conservação aproveitam a todos e, por isso, todos devem suportá-las, proporcionalmente ao valor de seus quinhões”. Segundo ele, permitir que apenas um dos condôminos assuma os encargos seria uma forma indireta de enriquecimento sem causa, prática vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Impostos e taxas seguem o imóvel, não a pessoa
Outro ponto fundamental levantado no acórdão foi a natureza do IPTU, classificado como dívida propter rem — um tipo de obrigação que acompanha o imóvel, e não quem o utiliza. Assim, mesmo que um dos coproprietários não exerça a posse direta do bem, ele não está desobrigado de arcar com os tributos.
A jurisprudência analisada pela corte paranaense foi unânime nesse sentido: a titularidade no registro é suficiente para gerar a obrigação pelo pagamento dos tributos, afastando a alegação de que a posse exclusiva do outro proprietário justificaria uma isenção. O artigo 1.316 do Código Civil, que prevê a possibilidade de renúncia à parte ideal como forma de exclusão das responsabilidades, também foi considerado. Como não houve renúncia, ambos permanecem responsáveis na proporção de sua participação.
Uma decisão que reforça a lógica da corresponsabilidade
Ainda que o uso cotidiano do imóvel possa parecer um fator relevante à primeira vista, a decisão do TJPR deixa claro que a propriedade traz consigo obrigações objetivas. O relator sintetiza a lógica ao afirmar: “O IPTU decorre da propriedade do imóvel, não da posse do bem, já que quem lá mora é proprietário”.
Na prática, a sentença estabelece um precedente importante para casos semelhantes, nos quais há litígios entre condôminos sobre quem deve pagar o quê. Reforça, sobretudo, que o direito à propriedade indivisa exige deveres compartilhados, sob risco de ferir os princípios de justiça e equidade que sustentam o direito civil brasileiro.





