A sensação de entrar em casa e perceber que a temperatura interna está quase tão alta quanto a externa virou um incômodo comum em um país que enfrenta ondas de calor cada vez mais intensas. Essa mudança no clima tem feito muita gente repensar não apenas o uso do ar-condicionado, mas a própria forma como a residência lida com o sol, o vento, os materiais e a vegetação ao redor.
A boa notícia é que existe uma série de estratégias — de projeto e de uso cotidiano — capazes de transformar o ambiente sem depender exclusivamente de aparelhos elétricos.
Entender de onde vem o calor é o primeiro passo
A arquiteta e urbanista Lusianne Azamor, coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Estácio, explica que o calor que sentimos dentro de casa tem múltiplas origens. Parte dele é trazida de fora para dentro pela radiação solar, que aquece telhados, paredes e janelas. Outra parte nasce dentro da própria casa, produzida por pessoas, lâmpadas, eletrodomésticos e até pelos móveis que acumulam temperatura ao longo do dia.

Segundo a profissional, não há mistério: “A radiação solar bate nas superfícies externas e tudo isso se converte em calor que migra para o interior. A forma como a casa está orientada no terreno, os materiais usados e a quantidade de aberturas têm impacto direto no conforto térmico”. Mesmo sem obra, é possível atuar nesses pontos por meio de sombreamento, ventilação cruzada e materiais que dissipam temperatura mais rápido.
A importância da orientação solar e do sombreamento inteligente
Nos modelos climáticos do hemisfério sul, a fachada voltada para o norte recebe sol praticamente o dia inteiro. Já a fachada oeste, que recebe o sol da tarde — o mais quente do dia — é considerada a mais crítica. Lusianne lembra que “o oeste é aquela orientação que a gente tenta evitar. E quando não há como alterar isso, entram em cena mecanismos como brises, persianas, venezianas e até barreiras vegetais com árvores e arbustos”.
Esse conjunto de soluções permite controlar o excesso de radiação sem impedir a entrada de luz natural, reduzindo o ganho térmico acumulado ao longo do dia. É uma estratégia também amplamente recomendada por arquitetos entrevistados em portais brasileiros especializados em construção bioclimática.
Vegetação como ferramenta estruturante do conforto
Há um consenso crescente entre urbanistas de que o verde não é apenas um elemento decorativo, mas uma ferramenta concreta de resfriamento natural. Segundo Lusianne Azamor, a vegetação cria sombra, reduz a temperatura por evapotranspiração e quebra a sensação de “ilha de calor” provocada por grandes áreas impermeáveis.

“O verde faz muita diferença. Ele reduz a retenção de calor, melhora o microclima e pode transformar um ponto quente em um ponto de frescor”, afirma. Pesquisas amplamente divulgadas por especialistas brasileiros mostram que bairros com arborização adequada chegam a registrar temperaturas até 8°C mais baixas em comparação a áreas densas e pavimentadas.
Esse raciocínio também se aplica ao lote individual. Jardins, gramados, árvores de copa larga, paredes verdes e telhados verdes são soluções que isolam, sombreiam e criam camadas protetoras contra o calor excessivo.
Estratégias práticas que funcionam no dia a dia
Quando a ideia não é iniciar uma obra ou investir em soluções estruturais, medidas simples podem oferecer alívio imediato. Pinturas claras — especialmente o branco refletivo — diminuem o aquecimento das superfícies externas. Cortinas, persianas e venezianas ajudam a controlar o sol direto durante as horas críticas. E mantas térmicas instaladas no forro criam uma barreira eficiente contra o calor que se acumula no telhado.
O ventilador, muitas vezes esquecido, se torna protagonista quando o ambiente já está protegido do sol excessivo. Seu baixo consumo energético é uma vantagem importante. E, segundo Lusianne, a escolha dos materiais também influencia: “Materiais que não retêm tanto calor, ou que dissipam temperatura mais rápido, ajudam muito”.
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O equilíbrio entre arquitetura, hábitos e tecnologia
O conforto térmico é resultado de uma soma de decisões, tanto de projeto quanto de uso cotidiano. Não se trata apenas de desligar o ar-condicionado, mas de equilibrar elementos naturais e escolhas funcionais para que a casa trabalhe a favor do bem-estar. “Com um bom projeto, conseguimos minimizar bastante o uso do ar-condicionado. É possível ter conforto térmico, consumir menos energia e viver em espaços mais agradáveis”, reforça Lusianne.





