Resumo
• Esculturas do tecelão curitibano Renê Scholz foram selecionadas para a exposição “Seda que une montanhas e mares”, em São Paulo, e seguem para o Museu Nacional da Seda da China.
• As obras foram criadas em 2014 para um projeto educacional no Vale da Seda e ficaram expostas no Museu do Vale da Seda, em Maringá, até receberem reconhecimento internacional.
• Renê, herdeiro de uma tradição familiar da Feira do Largo da Ordem, utilizou caules naturais trançados e fios coloridos de seda para representar filtros de sonhos da princesa Si Ling Shi.
• O tecelão Valdir Francisco, de Paranavaí, também teve uma obra selecionada, reforçando o protagonismo paranaense na sericultura brasileira, que concentra mais de 85% da produção nacional.
• A exposição destaca a história da seda, a Rota Marítima e 22 trajes da Dinastia Qing, conectando passado e presente enquanto apresenta o diálogo cultural entre Brasil e China.
A jornada de dois artefatos produzidos há mais de uma década no noroeste do Paraná acaba de ganhar um novo capítulo, desta vez em solo internacional. Duas esculturas criadas pelo artista plástico e professor curitibano Renê Scholz, reconhecido tecelão da Feira do Largo da Ordem, foram oficialmente incorporadas ao acervo do Museu Nacional da Seda da China, em Ganzhou, na província de Zhejiang. A decisão representa um marco para a arte têxtil brasileira e ressalta a ligação histórica entre Brasil e China por meio da sericultura.
As obras foram inicialmente selecionadas para a exposição “Seda que une montanhas e mares: da China ao Brasil”, atualmente em cartaz no Museu da Imigração de São Paulo, onde permanecem até 29 de março de 2026. Instalado no edifício da antiga Hospedaria de Imigrantes do Brás, o espaço abriga memórias da chegada de diferentes povos ao país, servindo como cenário simbólico para contar a trajetória da seda e suas conexões culturais ao longo dos séculos.
A jornada da seda: entre rotas marítimas, histórias e arte
A mostra apresenta a evolução da seda desde seu surgimento na antiguidade chinesa até suas incorporações contemporâneas no design, na moda e na arte. Ao abordar a Rota Marítima da Seda, a exposição reconstrói caminhos históricos que conectaram o Oriente e o Ocidente desde o século II a.C., evidenciando como essa rede de trocas moldou culturas, tecnologias e narrativas.
Nesse contexto, as peças de Renê Scholz se encaixam como homenagens às raízes da sericultura. Criadas em 2014, elas nasceram em um projeto educacional para estudantes de Nova Esperança, cidade conhecida como a capital brasileira da seda, localizada no Vale da Seda, região que concentra 29 municípios paranaenses dedicados à atividade.
De Maringá para o mundo
Depois de produzidas, as esculturas permaneceram no Museu do Vale da Seda, em Maringá, instituição responsável por preservar e divulgar a importância econômica da sericultura no noroeste do estado. Essa trajetória discreta sofreu uma reviravolta quando curadores chineses viram as obras na exposição paulistana e decidiram incorporá-las ao museu oriental, referência global no estudo, preservação e difusão da seda.
“Fiquei surpreso ao saber que as obras saíram de Maringá e vão para a China, com escala numa exposição tão importante em São Paulo”, afirmou o artista Renê Scholz, que exerce a tecelagem desde os anos 1980, tradição herdada de sua mãe, Zélia Scholz (1935–2021), pioneira da Feira do Largo da Ordem. Renê ainda mantém a barraca original da família, símbolo do artesanato paranaense e da perpetuação das técnicas manuais que marcam sua trajetória.
Além dele, o tecelão Valdir Francisco, de Paranavaí, também teve uma obra selecionada para integrar o acervo chinês. Ambos receberam o mesmo desafio: criar esculturas utilizando 1 kg de retalhos de seda, 1 kg de fios e 100 casulos do bicho-da-seda, materiais que remetem diretamente ao ciclo produtivo do fio mais valioso da civilização oriental.
Valdir trabalhou com uma estrutura de compensado; Renê recorreu a caules secos de trepadeiras, trançados naturalmente antes de serem revestidos por fios e tecidos de seda tingidos em múltiplas cores. O resultado é uma fusão entre o orgânico e o artesanal que dialoga com a própria essência da sericultura.
A princesa que descobriu a seda
As esculturas criadas por Renê representam filtros de sonhos inspirados na figura de Si Ling Shi, princesa chinesa tradicionalmente associada à descoberta da seda. Esposa do lendário Imperador Amarelo, ela teria percebido a resistência do fio ao ver um casulo dissolver-se em seu chá — episódio que, segundo a mitologia, marcou o início da fiação.
A sericultura, considerada a atividade agrícola-industrial mais antiga do planeta, surgiu na China há mais de cinco mil anos. No Brasil, começou a se desenvolver no século XIX e ganhou força no XX, impulsionada por comunidades imigrantes que trouxeram técnicas de cultivo e beneficiamento. Hoje, o Paraná responde por mais de 85% da produção nacional, reforçando seu papel de liderança no setor.
A exposição que conecta passado, presente e futuro
No Museu da Imigração, a mostra é organizada em três módulos — A Origem da Seda, As Rotas da Seda e A Beleza da Seda — que conduzem o visitante por peças históricas, experimentações contemporâneas e vestimentas meticulosamente reconstruídas. Entre os destaques estão 22 trajes da Dinastia Qing, representações de patrimônio cultural imaterial e obras que revelam a permanência dos saberes artesanais através das gerações.
Ao promover esse encontro entre memória e reinvenção, a exposição destaca como a seda atravessa séculos mantendo sua aura simbólica de sofisticação, espiritualidade e inovação. É nesse cenário híbrido que as obras de Renê Scholz encontram seu lugar, levando a identidade têxtil paranaense a um público global.
Serviço – Museu da Imigração
Horário de funcionamento:
– Terça a sábado: das 9h às 18h
– Domingo: das 10h às 18h
(Bilheteria fecha às 17h)
Nos feriados, vale o horário correspondente ao dia da semana.





